quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

O caminho





Existe sim um caminho e outro caminho e infinitos caminhos.
Ir,ir sempre.Impossível voltar pelo mesmo caminho.Que se cumpra chegar onde devo.
Paisagens são paragens do olhar.Efervecências como a vitamina C na água transparente.Passam.
Paixão é esta fricção da alma com o mundo que me cerca.Ir é ter fé mesmo que indefesa como uma criança.A viagem me torna adaptável as circunstâncias,maleável e receptiva.É vida.Tenra com a frescura do novo,os olhos brilhantes pelas surpresas.Atenta e flexível para contornar os riscos e desafios.Viajar é vencer a vida nos próprios passos.
-Por onde vou se me distraio em brincar pelo caminho?
Luz e sombra,o passar do vento,a um tempo a brisa,os pássaros que riscam o céu.Tudo é trânsito,tudo muda .A cena aparece em um sol abrasador e se oculta em uma noite tenebrosa.Caminho transformista.
Mergulho nas profundezas psicológicas,me obrigo a expressões em idiomas que desconheço.
O silêncio é companhia confortável onde se espraia a imaginação.
-O que existe no fundo dos rios e dos oceanos?
Passo por cidades esquecidas por Deus,lugares sem nome,pessoas em cujo rosto leio histórias,animais cativos em pastos e quintais.Rumor de cachoeira,auto estradas,avenidas em horário de rush.Rumor do quarto ao lado no hotel duas estrelas onde um homem ofega no ritmo do prazer de uma mulher.Rumor de idiomas diversos nas tvs de bares e cafés.O rumor do vento em fúria de tempestade.Flores e folhas se esparramam cíclicas,tudo se revolve e sai de seus lugares.
Os peixes na peneira,a lama do fundo dos lagos,os restos dos homens livres.A sardinha assada na brasa à moda portuguesa.
seria mais fácil se eu não pensasse.O apetite pela sardinha após longa caminhada,passos de ver vitrinas.Olhos de encanto.Comer é pausa.
Passa o tempo e nem percebo.-Será que assim não envelheço?
Ninguém pergunta se estou triste ou feliz.Aos que viajam as perguntas são sobre lugares;de onde viemos e para onde vamos.
A generosidade da arte,a música que chega de todos os lugares seguem comigo,companhia de viagem.E me concilio a outros e outras em passos de dança.
Tudo tem um sentido.E me olho com o excesso de bagagem.E me olho nas palavras que vou deixando pelo caminho.Escrevo para me entreter,escrevo porque duvido de mim e através da escrita me reconheço.
É como se ao me escrever eu criasse o espelho das minhas perplexidades.Escrever é o meu único caminho.O fio que me conduz é a tinta da caneta.Visível em azul ou preto luzidio como um rio que brilha em noite de lua cheia.
Escrever é o meu valor.
Criar é o exercício da verdadeira arte altruísta,pensar para aprender da vida a própria vida-o provisório sentido da vida.Uma marca que caminha e vai mudando de lugar,se estica.O sentido da vida é ser longe,alongar-se para se encontrar.Um elástico flexível.
Assim vou achando caminhos.
O eco do grito entre as montanhas.
O túnel claustrofóbico,o jeito infantil de cobria a cabeça para ficar segura e não ser descoberta.
O frio da passagem pelo túnel escuro.agua pinga em enchovia.Túnel húmido,abafado,condutor de medos.A travessia.Águas estagnadas.Percursos sombrios.
Assim vou deixando caminhos para trás.Sou só eu no dia seguinte.No momento seguinte.
Aproveito a sensação de não ter pressa alguma.Os momentos que não preciso dizer nada.As noites em que recordo toda a vida.
A bondade que encontro na infância,o gosto por um elogio sincero,o beijo de minha mãe antes de dormir,as leituras com meu pai.Tenho sorte,eles me fizeram acreditar.Acreditar que posso.
E posso.
Faz parte da minha natureza saborear a vida com esperança e o que não sei invento.
E posso.
Viajar tem gosto de para sempre.
Agora chove,chove torrencialmente,a água lava os caminhos.
E tem coisas que só Deus sabe.